segunda-feira, 12 de abril de 2010

Submerge-se a Sombra no Sol



[ Frequentava-te sem o saberes! Existia no limiar dos nossos corpos, naquela linha da silhueta desenhada à mao livre. Expandi-me como um gira-discos estragado, vezes sem conta, até me preencher contigo. Visito-te! Trago sempre uma lembrança muito insignificante feita da última vez que estive em ti. Irrito-te quando a primeira coisa que recebes quando me abres a porta são embrulhos dos cantos mortos e inúteis do teu espírito. E irrita-me o quão gosto de te ver assim! E frequento-te, sem o saberes...
Mudei de apartado às escondidas! Descobri outro corpo onde habitar. Sei que hoje é dia de suposta visita, e que continuas à minha espera, aí, nessa varanda coberta de folhagem seca que detestávas. Achavas que merecia uma recepção mais honesta e polida! Querias me dar o que não conhecias, e eu queria abraçar o que não queria... Entretanto (provavelmente) já voltaste para dentro dessa tua casa modesta que esvaziei de mim! Sentes o calafrio no zumbir surdino das paredes, agora nuas.
Vou-te enviando envelopes vazios duma morada que não existe para ti! Vai só com o nome apagado do remetente... Não sabes mas continuo a receber chamadas do antigo senhorio, reclamando da quantidade de correspondência que a minha minúscula caixa de correio continua a ocupar! De dois em dois dias uma nova carta cai lá, dentro dum rasgo enferrugado dum espaço que já não tenho. Nos dias de agora, reside lá a Senhora Aurora, ouço o senhorio contar-me, repetidas vezes...

Fiz-te em mim para conseguir largar-te sem sentir saudade!... ]

1 comentário:

  1. A intensidade da tua escrita quase nos 'engole'...
    Bonito, roberto.

    a eventual mourisca...*

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